História do Partido Comunista (Bolchevique) da URSS

Comissão do Comitê Central do PC(b) da URSS
Capítulo II — Formação do Partido Operário Social-Democrata da Rússia. Surgem duas frações no partido: a bolchevique e a menchevique (1901-1904)

2 — Plano de Lenin para a organização de um partido marxista. — O oportunismo dos "economistas". — A luta da "Iskra" em prol do plano de Lenin. — Aparece o livro de Lenin "Que Fazer?". — Os fundamentos ideológicos do partido marxista.

Apesar de haver-se celebrado em 1898 o primeiro Congresso do Partido Operário Social-Democrata Russo, no qual se havia proclamado a criação do Partido, a realidade era que este não estava formado ainda. Não tinha programa nem estatutos. O Comité Central do Partido eleito no primeiro Congresso foi detido e não voltou a reconstituir-se, pois não houve quem o reconstituísse. Mais ainda; depois do primeiro Congresso, a dispersão ideológica e a desarticulação orgânica do Partido, longe de diminuir, aumentaram.

Os anos de 1884 a 1894 foram o período de triunfo sobre o populismo e de preparação ideológica da social-democracia; durante os anos de 1894 a 1898, foram feitas uma série de tentativas, certamente infrutíferas, para criar, sobre a base das diversas organizações marxistas, um partido social-democrata; o período que segue a 1898 é um período de recrudescimento do caos ideológico e orgânico dentro do Partido. O triunfo do marxismo sobre o populismo e a atuação revolucionária da classe operária puseram em evidência a razão que assistia aos marxistas, com o que aumentaram as simpatias da juventude revolucionária pelo marxismo. O marxismo se tornou moda. Isto fez que invadissem as organizações marxistas massas inteiras de jovens revolucionários procedentes do campo intelectual, de formação teórica débil, inexperientes no aspecto político e em matéria de organização e que só tinham uma ideia confusa e em grande parte falsa do marxismo, nutrida nos escritos oportunistas dos "marxistas legais", de que estava infestada a Imprensa. Esta circunstância fez que descesse o nível teórico e político das organizações marxistas, infiltrou nelas as tendências oportunistas dos "marxistas legais" e aumentou a dispersão ideológica, as vacilações políticas e o caos orgânico.

A marcha ascendente, cada vez mais acentuada, do movimento operário e a clara iminência da revolução, reclamavam a criação de um partido único e centralizado da classe operária, capaz de pôr-se à frente do movimento revolucionário. Porém, o estado em que se encontravam os órgãos de base do Partido, os comités locais, os grupos e os círculos, era tão pouco satisfatório, sua desarticulação orgânica e sua falta de unidade ideológica tão grandes, que a criação de semelhante partido oferecia dificuldades incríveis.

Estas dificuldades não residiam somente no fato de ter que organizar o Partido sob o fogo das cruéis perseguições do czarismo, que arrebatava das fileiras das organizações os melhores militantes, para mandá-los ao desterro, ou às prisões. Havia, além disso, outra dificuldade, e era que uma parte considerável dos comités locais e de seus militantes não queria levantar a vista de seu pequeno trabalho prático local, não compreendia o dano que a falta de uma unidade orgânica e ideológica do Partido fazia; estava acostumada ao fracionamento deste e ao caos ideológico dentro dele, e imaginava que era possível prescindir de um partido único e centralizado.

Para criar um partido centralizado era preciso acabar com este atraso, com este estancamento e praticismo estreito dos órgãos locais.

Porém ainda havia mais. Existia dentro do Partido um grupo bastante numeroso de pessoas que tinha seus órgãos próprios na Imprensa, na Rússia, "Rabochaia Misl" ("O Pensamento Operário"), e, no estrangeiro "Rabochee Dielo" ("A Causa Operária"), e que pretendia justificar teoricamente a desarticulação orgânica e a dispersão ideológica do Partido, chegando inclusive, não poucas vezes, a elogiá-las, e considerando que a tarefa de criar um partido político único e centralizado da classe operária era uma tarefa desnecessária e artificial.

Este grupo era o dos "economistas" e seus sequazes.

A primeira coisa a fazer, para poder criar o partido político único do proletariado era acabar com os "economistas". Lenin tomou a si esta tarefa e a organização do Partido da classe operária.

Existiam diversos critérios acerca do problema de por onde devia começar-se a organizar o Partido único da classe operária. Alguns entendiam que a organização do Partido deveria começar pela convocação do II Congresso deste, deixando que ele se encarregasse de unificar as organizações locais e de criar o Partido. Lenin era contrário a esta opinião. A seu juízo, antes de convocar o congresso era necessário esclarecer o problema dos fins e tarefas do Partido, saber que classe de partido se pretendia organizar, deslindar ideologicamente os campos com os "economistas", dizer ao Partido, honrada e abertamente, que com respeito a seus fins e tarefas, existiam dois critérios distintos: o dos "economistas" e o dos social-democratas revolucionários, desencadear uma ampla campanha de propaganda na Imprensa em prol das ideias da social-democracia revolucionária, do mesmo modo que os "economistas" a desenvolviam em prol das suas por intermédio de seus órgãos, dar às organizações locais a possibilidade de escolher, com plena consciência, entre estas duas correntes; só depois de realizar este trabalho prévio, indispensável, se poderia convocar o congresso do Partido.

Lenin dizia, claramente:

"Antes de unificar-se e para unificar-se é necessário começar por deslindar os campos de um modo resoluto e definido". (Lenin, t. IX, pág. 378, ed. russa).

Eis aqui por que Lenin entendia que a organização do Partido político da classe operária devia ter como ponto de partida a criação de um periódico político combativo, destinado a toda a Rússia, no qual se fizesse propaganda e agitação em prol das ideias da social-democracia revolucionária, e que a criação deste periódico tinha que ser o primeiro passo para a organização do Partido.

Em seu conhecido artigo intitulado "Por onde começar?", Lenin esboçava um plano concreto de organização do Partido, que logo depois havia de desenvolver em seu célebre livro "Que Fazer?".

"A nosso juízo — dizia Lenin naquele artigo — o ponto de partida para atuação, o primeiro passo prático para a criação da organização desejada (isto é, para dizer a criação do Partido — nota da Redação —) e, finalmente, o fio fundamental a que teríamos que nos agarrar para desenvolver, aprofundar e ampliar inquebrantavelmente esta organização, deve ser a criação de um periódico político destinado a toda a Rússia... Sem este, não seria possível desenvolver de um modo sistemático uma propaganda e agitação, sólidos no plano dos princípios e extensivas a todos os aspectos, que são a tarefa constante e fundamental da social-democracia agora e sempre e que devem ser, sobretudo, a tarefa vital nos momentos atuais, em que o interesse pela política, pelos problemas do socialismo foi despertado nas mais extensas camadas da população" (Lenin, t. IV, pág. 110, ed. russa).

Lenin entendia que um jornal assim serviria de meio, não só para a coesão ideológica do Partido, como também para a unificação orgânica das diversas organizações locais, formando um partido. A rede de camaradas, agentes e correspondentes deste jornal, que seriam ao mesmo tempo, representantes das organizações locais, constituía o esqueleto em torno do qual se aglutinaria organicamente o Partido. Pois,

"o periódico" — dizia Lenin — não é só um propagandista e um agitador coletivo, como também um organizador coletivo".

"Esta rede de agentes — dizia Lenin no citado artigo — servirá de esqueleto precisamente para a organização de que necessitamos: será suficientemente grande para abarcar todo o país; suficientemente vasta e variada para poder introduzir nela uma rigorosa e detalhada divisão do trabalho; suficientemente resistente para saber prosseguir inquebrantavelmente seu trabalho sôb todas as circunstâncias e ante todas as "viragens" e situações inesperadas; suficientemente flexível para saber, de um lado não aceitar as batalhas em campo aberto contra um inimigo perigoso por sua força esmagadora, quando concentre toda sua força num ponto, porém sabendo, de outro lado, aproveitar-se da torpeza de movimentos deste inimigo e lançar-se sobre ele no lugar e no momento em que menos espere ser atacado". (Obra citada, pág. 112).

Eis aqui o que se queria que fosse o periódico "Iskra".

E, com efeito, a "Iskra" foi precisamente o periódico político que preparou a coesão ideológica e orgânica do Partido em toda a Rússia

No que se refere à sua estrutura e composição, Lenin entendia que o Partido devia constar de duas partes:

  1. um círculo reduzido de militantes, que formassem os quadros de direção fixos e no qual deviam entrar, fundamentalmente, os revolucionários profissionais, isto é, os militantes sem mais ocupação que o trabalho do Partido e dotados do mínimo indispensável de conhecimentos teóricos, de experiência política, de capacidade de organização e de habilidade para lutar com a polícia czarista e escapulir dela, e
  2. uma extensa rede de organizações periféricas do Partido, integradas por uma massa numerosíssima de filiados e rodeadas da simpatia e do apoio de centenas de milhares de trabalhadores.

"Eu afirmo — escrevia Lenin1) que não pode haver um movimento revolucionário sólido sem uma organização de dirigentes estável e que assegure a continuidade; 2) que quanto mais extensa for a massa que se sentir espontaneamente arrastada à luta... mais premente é a necessidade de semelhante organização e mais sólida tem que ser esta. 3) que dita organização deve estar formada, fundamentalmente, por homens integrados profissionalmente nas atividades revolucionárias; 4) que no país da autocracia, quanto mais restringirmos o contingente dos membros de uma organização deste tipo, até não incluir nela senão aqueles que se ocupem profissionalmente de atividades revolucionárias e que tenham já uma preparação profissional na arte de lutar com a polícia política, mais difícil será "caçar" esta organização, e 5) tanto maior será o contingente de indivíduos da classe operária e das demais classes da sociedade que poderão participar no movimento e colaborar ativamente nele". (Lenin, t. IV, pág. 456, ed. russa).

Quanto ao caráter do Partido que se tratava de criar e o seu papel em relação à classe operária, assim como quanto aos fins e tarefas do Partido, Lenin entendia que este devia ser o destacamento de vanguarda da classe operária, a força dirigente do movimento operário, que unificasse e orientasse a luta de classe do proletariado. A meta final do Partido havia de ser a derrubada do capitalismo e a instauração do socialismo. Sua meta imediata, derrubar o czarismo e implantar um regime democrático. E como a derrubada do capitalismo pressupunha a destruição do czarismo, o objetivo fundamental do Partido, naquele momento concreto, consistia em pôr de pé a classe operária e todo o povo para a luta contra o czarismo, em desencadear um movimento revolucionário popular contra o czarismo e em derrubar o regime czarista, que era o primeiro e o grande obstáculo que se levantava no caminho para o socialismo.

"A história nos apresenta hoje — dizia Lenin — uma tarefa imediata, que, mais que em nenhum outro país, é a mais revolucionária de todas as tarefas imediatas do proletariado. A realização desta tarefa, a derrubada do mais poderoso baluarte, não somente da reação europeia, senão também (podemos dizer hoje) da reação asiática, converteria o proletariado russo na vanguarda do proletariado revolucionário internacional" (Lenin, t. IV, pág. 382, ed. russa).

E noutro lugar escreve:

"Devemos recordar que a luta contra o governo por reivindicações parciais, a conquista de algumas concessões isoladas, não são mais do que pequenas escaramuças com o inimigo, pequenos combates de avançadas, e que a batalha decisiva não se deu ainda. Diante de nós se levanta com todo o seu poder a fortaleza inimiga, da qual nos são feitas descargas que varrem nossos melhores combatentes. Temos que tomar esta fortaleza e a tomaremos, se soubermos unir num só partido — ao qual se somará o que houve na Rússia de vital e honrado — todas as forças do proletariado, que já abriu os olhos e todas as forças revolucionárias russas. Só então se cumprirá a grande profecia do revolucionário operário russo Piotr Alexeiev: "Levantar-se-á o braço vigoroso dos milhões de homens operários, e o jugo do despotismo, defendido pelas baionetas dos soldados, saltará em pedaços" (Obra citada, pág. 59).

Tal era o plano de Lenin para a criação do Partido da classe operária, dentro das condições da Rússia czarista autocrática.

Os "economistas" não tardaram em romper o fogo contra o plano de Lenin.

Afirmavam que a luta no plano político geral contra o czarismo era incumbência de todas as classes e, sobretudo, da burguesia, e que não apresentava, portanto, nenhum interesse considerável para a classe operária, já que o que fundamentalmente interessava aos operários era a luta econômica contra os patrões pela elevação dos salários, a melhora das condições de trabalho, etc. Por conseguinte, os social-democratas não deviam indicar como tarefa imediata fundamental a luta política contra o czarismo, a derrubada do regime czarista, senão a organização da "luta econômica dos operários contra os patrões e o governo", entendendo por luta econômica contra o governo a luta pelo aperfeiçoamento da legislação industrial. Os "economistas" asseguravam que por este meio podia "dar-se à própria luta econômica um caráter político".

Os "economistas" já não se atreviam a manifestar-se formalmente contra a necessidade de um partido político para a classe operária. Porém entendiam que este partido não devia ser a força dirigente do movimento operário, que não devia imiscuir-se no movimento espontâneo da classe operária, nem muito menos dirigi-lo, senão marchar à retaguarda dele, estudá-lo e tirar ensinamentos dele.

Afirmavam do mesmo modo os "economistas" que o papel do elemento consciente no movimento operário, o papel organizador e orientador da consciência socialista, da teoria socialista, era insignificante ou pouco menos, que a social-democracia não devia elevar os operários ao nível da consciência socialista, senão, pelo contrário, descer e adaptar-se ao nível das camadas médias e inclusive das mais atrasadas da classe operária; que a social-democracia não devia inculcar na classe operária uma consciência socialista, senão esperar que o próprio movimento espontâneo da classe operária forjasse nela uma consciência socialista por suas próprias forças.

Quanto ao plano orgânico de estruturação do Partido, traçado por Lenin, consideravam-no como uma espécie de coação a que se pretendia submeter o movimento espontâneo.

Nas páginas da "Iskra" e, sobretudo, em seu célebre livro "Que Fazer?", Lenin se lançou contra esta filosofia oportunista do "economismo" e dela não deixou pedra sobre pedra.

1) Lenin assinala que desviar a classe operária da luta política geral contra o czarismo, reduzindo sua missão à luta econômica contra os patrões e o governo e deixando de pé e indenes a um e outros, significava condenar os operários à eterna escravidão. A luta econômica dos operários contra os patrões e o governo é uma luta de tipo tradeunista por lograr melhores condições de venda da força de trabalho aos capitalistas, porém os operários não querem lutar somente para melhorar as condições de venda de sua força de trabalho, senão que querem lutar também para destruir o próprio sistema capitalista, que os condena à necessidade de vender aos capitalistas sua força de trabalho e de se submeter à exploração. Pois bem, os operários não poderão desenvolver a luta contra o capitalismo, não poderão desenvolver a luta pelo socialismo, enquanto o czarismo, que é o cão de fila do capitalismo, se elevar no caminho do movimento operário. Por isso, a tarefa mais urgente do Partido e da classe operária consiste em afastar o czarismo, desembaraçando com isso o caminho para o socialismo.

2) Lenin assinalou que exaltar o processo espontâneo do movimento operário e negar o papel dirigente do Partido, reduzindo sua missão à de mero registrador dos acontecimentos, significava: pregar o "seguidismo" (ir "a reboque" dos acontecimentos), pregar que o Partido devia marchar à retaguarda do processo espontâneo; converter-se numa força passiva do movimento, apta somente para contemplar o processo espontâneo e abandonar-se a seu desenvolvimento automático. Preconizar isto equivalia a preconizar a destruição do Partido, isto é, a deixar a classe operária sem partido ou, o que é o mesmo, a desarmar a classe operária. E desarmar a classe operária num momento em que se levantavam diante dela inimigos tão poderosos como o czarismo, armado com todos os meios de luta e a burguesia, organizada à moderna e dotada de seu próprio partido que a dirigia na luta contra a classe operária, equivalia a trair o proletariado.

3) Lenin assinalou que prosternar-se ante o movimento operário espontâneo e rebaixar o papel do elemento consciente, o papel da consciência socialista, da teoria socialista, significava, em primeiro lugar, zombar dos operários, que tendem para a consciência como a planta para a luz, e em segundo lugar, desprestigiar a teoria aos olhos do Partido, ou melhor, a arma graças à qual o Partido tem consciência do presente e prevê o futuro, e em terceiro lugar, mergulhar total e definitivamente no charco do oportunismo.

"Sem teoria revolucionária — dizia Lenin — não pode haver tampouco movimento revolucionário... Só um partido dirigido por uma teoria de vanguarda pode cumprir sua missão de combatente de vangarda" (Lenin, t. IV, pág. 380, ed. russa).

4) Lenin assinalou que os "economistas" enganavam a classe operária afirmando que o movimento espontâneo do proletariado podia engendrar uma ideologia socialista, pois na realidade esta não brota do movimento espontâneo, senão da ciência. Negando a necessidade de inculcar na classe operária, uma consciência socialista, os "economistas" aplainavam o caminho à ideologia burguesa, ajudando-a a infiltrar-se, a penetrar na classe operária, e por conseguinte, enterravam a ideia da fusão do movimento operário com o socialismo e prestavam um serviço à burguesia.

"Tudo o que seja prosternar-se ante o movimento operário espontâneo — dizia Lenin — tudo o que seja rebaixar a importância do "elemento consciente", a importância da social-democracia, equivale — inteiramente independente da vontade de quem o faz — a fortalecer a influência da ideologia burguesa sobre os operários". (Obra citada, pág. 390).

E mais adiante:

"O problema se apresenta somente assim: ideologia burguesa ou ideologia socialista? Não há meio termo... Por isso, tudo o que seja rebaixar a ideologia socialista, tudo o que seja afastar-se dela, equivale a fortalecer a ideologia burguesa". (Obra citada, pág. 391-398).

5) Resumindo todos estes erros dos "economistas", Lenin chegou à conclusão de que o que eles aspiravam não era criar o partido da revolução social, que emancipasse do capitalismo a classe operária, senão um partido de "reformas sociais", cuja premissa era a manutenção da dominação do capitalismo, que, portanto, os "economistas" eram reformistas que atraiçoavam os interesses fundamentais do proletariado.

6) Finalmente, Lenin assinalou que o "economismo" não brotara na Rússia por azar, senão que seus mantenedores eram o veículo da influência burguesa sobre a classe operária e que seus aliados nos partidos social-democratas dos países ocidentais eram os revisionistas, os adeptos do oportunista Bernstein. Entre os social-democratas da Europa Ocidental se ia fortalecendo cada vez mais a corrente oportunista, que atuava sob a bandeira da "liberdade de crítica" do marxismo, exigia a "revisão" da teoria de Marx (daí o nome de "revisionismo") e exigia que se renunciasse à revolução, ao socialismo, à ditadura do proletariado. Pois bem, Lenin demonstrou que esta mesma linha de renúncia à luta revolucionária, ao socialismo e à ditadura do proletariado era o que seguiam os "economistas" russos.

Tais são as teses teóricas fundamentais desenvolvidas por Lenin em seu livro "Que Fazer?".

A difusão desta obra de Lenin foi tão eficaz, que no ano de seu aparecimento ("Que Fazer?" veio à luz em março de 1902) na época em que se celebrou o II Congresso do Partido Social-Democrata da Rússia, já não restava das posições ideológicas dos "economistas" mais que uma recordação pouco agradável, e o apelido de "economistas" começava a ser considerado pela maioria dos militantes do Partido como um insulto.

O "economismo", a ideologia do oportunismo, do "seguidismo" e do automatismo, tinha ficado completamente pulverizado.

Porém a importância da obra de Lenin "Que Fazer?" não se reduziu a isto.

A significação histórica desta famosa obra consiste em que nela Lenin:

  1. põe a nu pela primeira vez na história do pensamento marxista, até as suas últimas raízes, as fontes ideológicas do oportunismo, demonstrando que consistem, antes de tudo, em prosternar-se perante a espontaneidade do movimento operário e rebaixar o papel da consciência socialista no movimento proletário.
  2. reivindicou em todo seu valor a importância da teoria, do elemento consciente, do Partido, como força revolucionária e dirigente do movimento operário espontâneo.
  3. fundamentou de um modo brilhante a tese fundamental do marxismo, segundo a qual o Partido marxista é a fusão do movimento operário com o socialismo.
  4. elaborou genialmente os fundamentos ideológicos do Partido marxista.

As teses teóricas desenvolvidas na obra "Que Fazer?" serviram logo depois de base para a ideologia do Partido bolchevique.

Armada com esta riqueza teórica, a "Iskra" pôde desenvolver e desenvolveu, com efeito, uma ampla campanha em prol do plano leninista de organização do Partido, em prol da concentração de forças do Partido, em prol do II Congresso do Partido, em prol de uma social-democracia revolucionária, contra os "economistas", contra os oportunistas de toda a classe e jaez, contra os revisionistas.

A tarefa mais importante realizada pela "Iskra" consistiu em elaborar um projeto de programa do Partido. O programa do Partido operário é, como se sabe, uma breve exposição, plasmada em fórmulas científicas, dos fins e tarefas de luta da classe operária. O programa traça tanto a meta final do movimento revolucionário do proletariado como as reivindicações, pelas quais o Partido luta em sua marcha para a meta final. Por isso, a elaboração de um projeto de programa não podia deixar de ter uma importância primordial.

Durante a elaboração do projeto do programa surgiram, no seio da redação da "Iskra", sérias divergências entre Lenin e Plekhanov, assim como entre Lenin e os demais redatores. Estas divergências e dissenções estiveram a ponto de conduzir a uma ruptura completa entre Lenin e Plekhanov. Porém a ruptura não chegou a produzir-se por aquela época. Lenin logrou que no projeto de programa se fizesse figurar o ponto importantíssimo da ditadura do proletariado e se proclamasse de um modo terminante o papel dirigente da classe operária na revolução.

Obra de Lenin era também toda a parte agrária do Partido. Lenin já era então partidário da nacionalização da terra, ainda que na primeira etapa da luta reputasse necessário lançar a consigna da devolução dos camponeses arrebatados pelos latifundiários no momento de sua "emancipação". Plekhanov, em troca, se manifestava contra a nacionalização da terra.

As divergências entre Lenin e Plekhanov em torno do programa do Partido já eram uma antecipação da delimitação de campos que mais adiante havia de se traçar entre os bolcheviques e os mencheviques.


pcr
Inclusão 17/10/2010